Para 2020

Paul Klee

Paul Klee

Para 2020, “torna-te o que és”!

Esta máxima, atribuída a Píndaro, está perfeitamente enquadrada na sabedoria apolínea, irmã, por exemplo, do célebre “conhece-te a ti mesmo” délfico (que o Sócrates de Platão tão bem ilustrou). Ela será retomada por Nietzsche, destacada no subtítulo do seu último livro, Ecce Homo: Wie man wird, was man ist (como vir a ser o que se é)

Para este pensador (nunca tremo ao designá-lo assim), todas as antropotécnicas são válidas para virmos a ser o que somos, não no sentido heideggeriano de uma autenticidade metafísica que substitua, e supere, as formas de ascese religiosa, mas como encontro do impessoal que até certo ponto governa a nossa pessoalidade (considerada, com muita imprecisão, o “eu”). Mas não será Nietzsche o inventor do eremitismo heróico moderno, que em vez de esvaziar a subjectividade a amplifica até ao estouro? (Übermensch = super-homem) Não, essa é apenas uma velha e desajustada forma de o ler. Se lhe prestarmos a devida atenção, partindo, por exemplo, do que escreve em Assim Falou (ou Falava) Zaratustra, o sujeito é a soma de uma ficção linguística com um dispositivo religioso para manter viva a ampla economia da culpa e do ressentimento. E mesmo quando confrontado com aquilo que pouco tempo depois dele dirá Freud (afirmava não o ter lido seriamente porque temia descobrir que o plagiava), resiste coerentemente à tentação de tudo, ou quase tudo, convergir para o eu (em Freud, deve-se escavar o inconsciente e enchê-lo de uma consciência cada vez mais plena, pessoalizar o impessoal). Em Nietzsche, o devir individual (um tornar-se que nunca se conclui, dinâmica assimptota) conduz, por linhas mais travessas do que direitas, ao “si” (Selbst), em Freud, com a ajuda do psicanalista nos casos mais difíceis, ao ego.

Bom, mas então como e para quê tornarmo-nos o que somos?

Como: buscando a base da estrutura orgânica, as forças construtivas e destrutivas (nisto, Nietzsche e Freud coincidem) que alimentam a nossa passagem por aqui (estamos, quer queiramos, quer não, sempre num devir inexorável). Não ser de nenhum lado (o nacionalismo é tão arcaico que custa acreditar na sua sobrevivência), não ter nenhum nome. Os caprichos individuais substituídos pela biologia do sistema respiratório. Venerar também o inorgânico que somos, até porque essa será a nossa condição dominante futura.

Para quê: para amarmos outras coisas para lá de nós próprios, amá-las verdadeiramente, não como fazemos agora em modo boomerang. O verdadeiro amor só pode ser incondicional, e por isso acontece apenas em relação ao distante, ao mais distante possível. Não cabe nele, com certeza, o amor paixão (invenção recente) ou o familiar. Não cabe também, embora se aumente a distância, a amizade. Nem qualquer neo-humanismo. Começa a ocorrer no amor por outras espécies e outras formas de vida. Aproxima-se quando chegamos, por exemplo, ao reino mineral (em pura contemplação). Intensifica-se se amarmos uma estrela, não porque nos ilumina, mas porque a amamos em si mesma sem querer nada em troca. Finalmente, fica pleno quando amamos o nada. Aí tornamo-nos aquilo que somos, já que as forças afirmativas que nos compõem se libertam de qualquer resquício narcisista e aceitam, sem conflitos, patentes ou latentes, que também nós somos nada, a máxima potência da impessoalidade.

Claro, com isto vou contra a epistemologia, a ética, a política, a economia... Enfrento todo o magnífico senso comum que nos governa, sobretudo nos fins de ano. Mas enfim, ninguém se dará ao trabalho de me lançar bombas incendiárias.

Para quem vir aqui uma qualquer forma de niilismo, parabéns, acertou. Mas cuidado, é o niilismo completo de Nietzsche. Que na altura combatia o grosseiro fetichismo da importância última do eu, do eu acima de tudo, a derradeira hipertrofia do eu. Alimentado e exacerbado na viagem que nos trouxe dos primórdios da consciência até aos glutões do Planeta. Como pensava Nietzsche, à morte de Deus deveria seguir-se a do homem, desde homem, para que o sobre-homem possa surgir, até porque só ele conseguirá, verdadeiramente, amar o distante. Pelo contrário, sem superação do humano, as actuais sociedades imunitárias tenderão a ser governadas pelo absurdo, cheias de querelas de egos e de sem-sentido, festa da autodestruição.

Anne Sexton, "Disse a poetisa ao analista"

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Tradução: João Coles


O meu ofício são as palavras. As palavras são como rótulos,
ou moedas, ou melhor, como um enxame de abelhas.
Confesso a minha ruína pela origem das coisas;
como se as palavras fossem contadas como abelhas mortas no sótão,
despojadas dos seus olhos amarelos e das suas secas asas.
Devo sempre esquecer como uma palavra é capaz de escolher
outra, influenciar outra, até obter
algo que pudesse ter dito...
mas que o não tenha dito.

O seu ofício é examinar as minhas palavras. Mas eu
não admito nada. Faço o meu melhor, por exemplo,
quando consigo escrever um encómio a uma caça-níqueis,
como naquela noite no Nevada: contar como o mágico jackpot veio a tilintar
com três sinos no ecrã da sorte.
Mas dissesse o senhor que isto é algo que não é,
então esmoreço e lembro-me de como senti as minhas mãos tão estranhas
e ridículas e lotadas com todo aquele
dinheiro crente.


Said the poet to the analyst

 My business is words. Words are like labels,
or coins, or better, like swarming bees.
I confess I am only broken by the sources of things;
as if words were counted like dead bees in the attic,
unbuckled from their yellow eyes and their dry wings.
I must always forget how one word is able to pick
out another, to manner another, until I have got
something I might have said…
but did not. 

Your business is watching my words. But I
admit nothing. I work with my best, for instance,
when I can write my praise for a nickel machine,
that one night in Nevada: telling how the magic jackpot
came clacking three bells out, over the lucky screen.
But if you should say this is something it is not,
then I grow weak, remembering how my hands felt funny
and ridiculous and crowded with all
the believing money.

a felicidade efémera de antífon, pintor de vasos ateniense, ca. 490 a.C.

Vaso de figuras vermelhas, ca. 490-480 aC, oriundo da Ática e encontrado em Orvieto. Atribuído ao pintor Antífon. Hoje no museu Ashmolean, em Oxford.

Vaso de figuras vermelhas, ca. 490-480 aC, oriundo da Ática e encontrado em Orvieto. Atribuído ao pintor Antífon. Hoje no museu Ashmolean, em Oxford.

a partir de C. P. Cavafy

pistachos e solidão
enchem a oficina do chão ao tecto
durante as noites de outono
lá fora a chuva que cai a cântaros
dá cabo dos nervos e é
uma forma de medir o tempo
humilde no escuro como uma romã
e escuridão é o que atravessa o vermelho
das sementes derrubadas sobre a mesa
e alguma espécie de má sorte
tem-me acordado toda a noite
rumino lentamente tudo o que me preocupa
inutilidades banais disputas com outras artesãos
todas as parvoíces que não me deixam
fazer o meu trabalho em paz
e conto as minhas pequenas alegrias
elas deixam-me sempre perplexo
as suas sementes semeio-as no escuro
elas contêm a noite e vão
um dia talvez chegar à primavera
que chegará muito depois
de eu ter deixado
os tigres caminharem sobre o meu peito
sem razão
também no que parece ser escuridão
um negro absurdo e absoluto
farei iluminar a sua figura que agora me foge
ao centro sentado absorto no seu trabalho
o seu nome e o meu hão-de desaparecer
e esse esquecimento
outra forma de alegria
será o selo do nosso segredo
mas ele será ainda mais esquecido do que eu
porque é ainda mais efémero o seu trabalho
os meus traços sobre a superfície
farão o seu rosto a princípio parecer
mais indefinido
e de mim será dito que preferi sempre
pintar nos vasos
cenas com rapazes aristocráticos atenienses
e batalhas míticas para
serem vistas e adoradas em banquetes
por ainda mais rapazes
aristocráticos atenienses
cenas onde se pode observar
os mais respeitáveis heróis gregos
os mais sangrentos mitos da grécia
os arqueólogos notarão
que são poucas as mulheres
que surgem nos vasos onde se pode reconhecer
a minha mão, a mão por que será reconhecido o meu nome
que não será já o meu nome
mas o nome que outros me terão dado
em virtude de serem reconhecíveis os meus traços
os meus padrões, mesmo na solidão de mínimos cacos
nas imagens que ficarão perdidas para sempre
elaborados pormenores deixarão
emergir o meu verdadeiro nome
e que se entenda que foi meu o meu trabalho
que este trabalho
por certos pormenores se fez famoso
e não há nada de errado
em um artesão capaz querer viver
em paz
da sua arte
com uma certa dignidade
mas não nesta noite
e não para o trabalho deste vaso
que será descoberto muito longe de onde
se passou esta cena e esta cena devia
ela própria ser efémera
nem tu pensarás de imediato
em páginas saídas da história
em gente como dario ou xerxes ou nos anos
em que os malditos persas
atravessaram o helesponto
para nos darem o inferno em atenas

este jovem que não é nem aristocrata
nem efebo mítico nem terá nome
ficará assim pacientemente sentado
diante do capacete que foi o seu trabalho
esculpir de uma só peça
atento, quase imóvel, quase vencendo o tempo
à velocidade de uma corrida mortal
a sua mão alonga os gestos
que terminarão o trabalho que não é o meu
esta intenção opressiva esculpida no bronze
a força desta leveza quase luz fazendo inchar o peito
até ao transporte final das imagens através da escuridão
transformadas em incêndio e pelo fogo visíveis
antes queria não ter sabido nada disto
queria tê-lo deixado dormir quieto na oficina
entre os pistachos e as romãs
aconteceu então
embora eu não o tivesse entendido
que foi minha uma coisa breve do mundo
de repente um rosto reconhecido
e esta outra arte mais difícil de dominar
muito dificilmente conquistada
aquilo que aqui se pode ver agora
uma efémera lei do caos, indecifrada

Tatiana Faia, Oxford
30 de Setembro de 2019

"Produzo poesia, uma mercadoria inconsumível", Pier Paolo Pasolini

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Tradução: João Coles

Esta entrevista reproduz um trecho da intervenção de Pasolini na transmissão de um episódio do programa de Enzo Biagi “Terza B facciamo l'appello”, que deveria ter ido para o ar em Julho de 1971. Foi, contudo, suspenso graças a um processo judiciário que implicava Pasolini na qualidade de director responsável de “Luta Continua” (“instigação à desobediência” e “propaganda antinacional”). O episódio foi transmitido quatro anos mais tarde, no dia 3 de Novembro de 1975, no dia após o seu assassinato.

Entrevista:

O senhor escreveu: "No plano existencial eu sou um contestador global. A minha desesperada desconfiança em todas as sociedades históricas leva-me a uma forma de anarquia apocalíptica". Com que mundo sonha?

Durante um tempo, quando era jovem, acreditei na revolução como acreditam os jovens de hoje em dia. Hoje em dia acredito um bocado menos. Sou, neste momento, apocalíptico. Vejo defronte de mim um mundo doloroso, cada vez mais vil. Não tenho esperanças; portanto não esboço sequer um mundo futuro.


Quer parecer-me que já não acredita nos partidos.

Não. Se me diz que já não acredito nos partidos está a chamar-me qualunquista; eu, pelo contrário, não sou um qualunquista. Inclino-me mais para uma forma anárquica do que para uma escolha ideológica de algum partido, mas não significa que não acredite nos partidos.


Porque é que defende que a burguesia está a triunfar?

A burguesia está a triunfar porquanto a sociedade neocapitalista é a verdadeira revolução da burguesia. A civilização do consumo é a verdadeira revolução da burguesia. E não vejo outra alternativa, porque também no mundo soviético, na verdade, a característica do homem não é tanto a de ter feito a revolução e de a viver, mas a de ser um consumista. A revolução industrial nivela o mundo inteiro.


O senhor bate-se contra a hipocrisia, sempre. Quais os tabus que destruiria: as prevenções no sexo, o escapulir-se às realidades mais cruas, a falta de sinceridade nas relações sociais?

Dizia isto até dez anos atrás. Hoje já não digo estas coisas porque não acredito nelas. A palavra “esperança” foi apagada do meu vocabulário. Portanto, continuo a lutar por verdades parciais, de momento a momento, de hora em hora, de mês a mês, mas não perspectivo programas a longo prazo por já não acreditar nisso.


Já não tem esperança?

Não.


Esta sociedade que o senhor não ama deu-lhe, no fundo, sucesso e notoriedade...

O sucesso não é nada. O sucesso é a outra face da perseguição. E o sucesso é uma coisa péssima para um homem. Pode exaltar naquele momento, pode dar algumas satisfações e certas vaidades, mas na verdade, mal alcançado, compreende-se que é algo péssimo. Por exemplo, ter encontrado os meus amigos aqui, na televisão, não é bonito. Felizmente conseguimos ir além dos microfones e do vídeo e reconstruímos algo real e sincero; mas como posição é péssima e falsa.


Porquê? O que vê de tão anormal?

Porque a televisão é um meio de massa, que não faz senão alienar-nos.


Porém, fora os queijos e o resto, este meio leva a casa as suas palavras. Estamos todos a discutir com grande liberdade, sem qualquer inibição.

Não, não é verdade.


Sim, é verdade. Pode dizer tudo o que quiser.

Não, não posso dizer tudo o que quiser.


Pois diga.

Não, não posso, porque seria acusado de vilipêndio pelo código fascista italiano. Na verdade, não posso dizer tudo. E, objectivamente, perante a ingenuidade e desprevenção de alguns espectadores, eu próprio não quero dizer determinadas coisas. Mas posto isto de parte, é o meio de massa em si: a partir do momento em que alguém nos ouve desde um vídeo estabelece-se entre nós uma relação de inferior a superior, que é uma relação assustadoramente antidemocrática.


Julgo que em alguns casos também possa ser uma relação de igualdade: porque é que o não pode ser?

Alguns espectadores, por privilégio social, podem ser culturalmente semelhantes. Mas normalmente as palavras que caem do vídeo caem sempre de cima, até as mais democráticas, mesmo as mais sinceras. O conjunto da “coisa vista” em vídeo adquire sempre um ar autoritário, fatalmente, porque nos é sempre dada como uma cátedra. Falar desde o vídeo é falar sempre ex cathedra, mesmo quando isto é mascarado de democraticidade.


Foi, há muitos anos atrás, por Ragazzi di vita, um dos primeiros escritores italianos chamados a comparecer em tribunal sob a acusação de obscenidade: como encara alguns dos escritores eróticos de hoje e este alastramento do erotismo no cinema, nas livrarias e nas bancas?

Para mim, o erotismo na vida é uma coisa belíssima, mesmo na arte: é um elemento que tem direito de cidadania numa obra como qualquer outro. O importante é que não seja vulgar; mas por vulgaridade não pressuponho o que se entende geralmente, mas sim uma disposição racista ao observar o objecto do eros. Por exemplo, a mulher nos filmes ou nas bandas-desenhadas eróticas é vista de maneira racista como um ser inferior, logo é vista vulgarmente. Ora, neste caso o eros é puramente algo comercial, vulgar.


Como é que um marxista como o senhor extrai com tanta frequência inspiração de temas vindos do Evangelho ou dos testemunhos dos apóstolos de Cristo?

Obviamente que o meu olhar para as coisas do mundo, para os objectos, é um olhar natural, não laico: extraio as coisas como se fossem miraculosas. Cada objecto é para mim miraculoso: tenho uma visão – sempre de maneira informe, digamos assim – não confessional, em certa medida religiosa, do mundo. Eis porque dou uma investidura desta maneira de ver as coisas mesmo às minhas obras.


O Evangelho consola-o?

Não busco consolações. Busco de forma humana, de quando em vez, alguma pequena alegria, alguma pequena satisfação, mas as consolações são sempre retóricas, insinceras, irreais.. Disse o Evangelho de Cristo? Não, neste caso excluo completamente a palavra “consolação”: para mim, o Evangelho é uma mui grande obra intelectual, uma grande obra de reflexão que não consola: que preenche, que integra, que regenera... mas a consolação, que faço eu com a consolação? “Consolação” é uma palavra como “esperança”.


De acordo consigo, os intelectuais italianos comprometem-se demasiado: falemos de nomes, citemos casos...

O compromisso pode resumir-se a uma só questão: a de aceitar acriticamente – pois se fosse crítico, poder-se-ia admitir, aliás, creio que seria inevitável – a integração.


Tão-pouco a aceita?

Sim, mas de modo crítico (como vê, premuni-me). Isto é, claro que não posso não aceitá-la: tenho de ser consumista à força, porque também eu tenho de me vestir, tenho de viver; não só mas também tenho de escrever ou fazer filmes e, por isso, tenho de ter editores e produtores...


Portanto, também produz para o consumo.

A minha produção consiste em criticar a sociedade que num certo sentido consente, pelo menos por agora, que eu de algum modo produza.


A sociedade sempre amou imensamente quem produzia dizendo não amá-la.

Sim, é verdade. Pode ser que as senhoras da boa burguesia gostem, num certo sentido, de ser alvos. A sociedade procura assimilar, integrar, claro: é uma operação que tem de ser feita para se defender. Mas nem sempre consegue e às vezes há operações de rejeição. Tanto mais que não podemos falar de poesia como de mercadoria: eu produzo, mas não produzo uma mercadoria que na realidade seja consumável, e, portanto, cria-se uma relação entre mim e os consumidores. Imagine que a certa altura, na Lombardia, chega um sujeito que inventa um tipo de sapatos que não nunca se consumirá, e que seja uma indústria milanesa a produzir estes sapatos: pense na revolução que ocorreria na Valle Padana, pelo menos no sector do calçado. Eu produzo uma mercadoria, a poesia, que é inconsumível: morrerei eu, morrerá o meu editor, morremos todos nós, morrerá a nossa sociedade, morrerá o capitalismo, mas a poesia permanecerá inconsumpta.



Produco poesia, una merce inconsumabile

Pier Paolo Pasolini


Lei ha scritto: "Sul piano esistenziale io sono un contestatore globale. La mia disperata sfiducia in tutte le società storiche mi porta a una forma di anarchia apocalittica". Che mondo sogna?

Per un certo tempo, da ragazzo, ho creduto nella rivoluzione come ci credono i ragazzi di adesso. Adesso comincio a crederci un po’ meno. Sono, in questo momento, apocalittico. Vedo di fronte a me un mondo doloroso, sempre più brutto. Non ho speranze. Quindi non mi disegno nemmeno un mondo futuro.


Mi pare che lei non creda più ai partiti.

No. Se lei mi dice che non credo più ai partiti mi dà del qualunquista, invece io non sono qualunquista. Tendo più verso una forma anarchica che verso una scelta ideologica di qualche partito, ma non è che non creda ai partiti.


Perché lei sostiene che la borghesia sta trionfando?

La borghesia sta trionfando in quanto la società neocapitalistica è la vera rivoluzione della borghesia. La civiltà dei consumi è la vera rivoluzione della borghesia. E non vedo altre alternative, perché anche nel mondo sovietico, in realtà, la caratteristica dell’uomo non è tanto quella di aver fatto la rivoluzione e di viverla, ma quella di essere un consumista. La rivoluzione industriale livella tutto il mondo.


Lei si batte contro l’ipocrisia, sempre. Quali sono i tabù che lei distruggerebbe: le prevenzioni sul sesso, lo sfuggire alle realtà più crude, la mancanza di sincerità nei rapporti sociali?

Mah, questo l’ho detto fino a dieci anni fa. Adesso non dico più queste cose perché non ci credo. La parola "speranza" è cancellata dal mio vocabolario. Quindi continuo a lottare per verità parziali, momento per momento, ora per ora, mese per mese, ma non mi pongo programmi a lunga scadenza perché non ci credo più.


Lei non ha speranze?

No.


Questa società che lei non ama in fondo le ha dato il successo, la notorietà…

Il successo non è niente. Il successo è l’altra faccia della persecuzione. E poi il successo è sempre una cosa brutta per un uomo. Può esaltare, al momento, può dare delle piccole soddisfazioni a certe vanità, ma in realtà, appena ottenuto, si capisce che è una cosa brutta. Per esempio, il fatto di aver trovato i miei amici qui, alla televisione, non è bello. Per fortuna noi siamo riusciti ad andare al di là dei microfoni e del video, e a ricostruire qualcosa di reale e di sincero; ma come posizione è brutta, è falsa.


Perché? Che cosa ci trova di così anormale?

Perché la televisione è un medium di massa, che non può che alienarci.


Ma oltre ai formaggini e al resto, questo mezzo porta in casa adesso anche le sue parole. Noi stiamo discutendo tutti con grande libertà, senza alcuna inibizione.

No, non è vero.


Sì, è vero. Lei può dire tutto quello che vuole.

No, non posso dire tutto quello che voglio.


Lo dica.

No, non potrei, perché sarei accusato di vilipendio dal codice fascista italiano. In realtà non posso dire tutto. E poi, oggettivamente, di fronte all’ingenuità o alla sprovvedutezza di certi spettatori, io stesso non vorrei dire certe cose. Ma a parte questo, è il medium di massa in sé: nel momento in cui qualcuno ci ascolta dal video ha verso di noi un rapporto da inferiore a superiore, che è un rapporto spaventosamente antidemocratico.


Io penso che in certi casi sia anche un rapporto alla pari: perché non potrebbe esserlo?

Alcuni spettatori, per privilegio sociale, possono esserci culturalmente pari... Ma in genere le parole che cadono dal video cadono sempre dall’alto, anche le più democratiche, anche le più sincere. L’insieme della "cosa vista" sul video acquista sempre un’aria autoritaria, fatalmente, perché viene sempre data come una cattedra. Il parlare dal video è sempre parlare ex cathedra, anche quando questo è mascherato da democraticità.


Lei è stato, molti anni fa, per Ragazzi di vita, uno dei primi scrittori italiani chiamati a comparire in tribunale sotto l’accusa di oscenità: a distanza di tempo, come giudica certi scrittori erotici di oggi e questo dilagare dell’erotismo nel cinema, nelle librerie e nelle edicole?

Mah, per me l’erotismo nella vita è una cosa bellissima, e anche nell’arte: è un elemento che ha diritto di cittadinanza in un’opera come qualsiasi altro. L’importante è che non sia volgare; ma per volgarità non intendo quel che si intende generalmente, ma una disposizione razzistica nell’osservare l’oggetto dell’eros. Ad esempio, la donna nei film o nei fumetti erotici è vista razzisticamente come un essere inferiore, quindi è vista volgarmente. Allora, in questo caso, l’eros è puramente una cosa commerciale, volgare.


Come mai un marxista come lei trae tanto spesso ispirazione dai soggetti che escono dal Vangelo o dalle testimonianze dei seguaci di Cristo?

Evidentemente il mio sguardo verso le cose del mondo, verso gli oggetti, è uno sguardo non naturale, non laico: tratto le cose un po’ come miracolose. Ogni oggetto per me è miracoloso: ho una visione – in maniera sempre informe, diciamo così – non confessionale, in un certo qual modo religiosa, del mondo. Ecco perché investo di questo modo di vedere le cose anche le mie opere.


Il Vangelo la consola?

Mah, non cerco consolazioni. Cerco umanamente, ogni tanto, qualche piccola gioia, qualche piccola soddisfazione, ma le consolazioni sono sempre retoriche, insincere, irreali… Lei dice il Vangelo di Cristo? No, in questo caso escludo totalmente la parola "consolazione": per me il Vangelo è una grandissima opera intellettuale, una grandissima opera di pensiero che non consola: che riempie, che integra, che rigenera… ma la consolazione, che me ne faccio della consolazione? "Consolazione" è una parola come "speranza".


Secondo lei gli intellettuali italiani scendono a troppi compromessi: facciamo dei nomi, citiamo dei casi…

Il compromesso si può riassumere in un punto solo: quello di accettare in modo acritico – perché se fosse critico si potrebbe anche ammettere, anzi credo sarebbe inevitabile – l’integrazione.


Non l’accetta anche lei?

Sì, ma in modo critico (come vede, mi ero premunito). Cioè, certo non posso non accettarla: devo essere un consumista per forza, perché anche io mi devo vestire, devo vivere; non soltanto, devo scrivere o fare dei film e quindi devo avere degli editori, dei produttori…


Quindi anche lei produce per il consumo.

La mia produzione consiste nel criticare la società che in un certo senso mi consente, almeno per ora, di produrre in qualche modo.


La società ha sempre tremendamente amato chi produceva dicendo di non amarla.

Sì, è vero: può darsi che le signore della buona borghesia amino, in un certo senso, essere colpite. La società cerca di assimilare, di integrare, certo: è un’operazione che deve fare per difendersi. Però non sempre ci riesce, a volte ci sono delle operazioni di rigetto. Tanto più poi che non possiamo parlare di poesia come di merce: io produco, ma produco una merce che in realtà è inconsumabile, e quindi c’è un rapporto strano tra me e i consumatori. Immagini che a un certo punto, in Lombardia, arrivi uno che inventa un certo tipo di scarpe che non si consumeranno mai più, e che un industriale milanese costruisca queste scarpe: pensi alla rivoluzione che succederebbe nella Valle Padana, almeno nel settore dei calzaturifici. Io produco una merce, la poesia, che è inconsumabile: morirò io, morirà il mio editore, moriremo tutti noi, morirà tutta la nostra società, morirà il capitalismo ma la poesia resterà inconsumata.