O funeral de Sarpédon
/Konstantinos Kavafis (1898)
Tradução de Manuel Resende
Fundo é o sofrimento de Zeus. Pátroclo
matou Sarpédon; e agora precipitam-se
Menécida e os aqueus para o seu corpo
arrebatarem e o desonrarem.
Mas Zeus de modo algum isso consente.
O seu querido filho — a quem abandonou
e se perdeu; assim impunha a lei
— ao menos honrará, agora que está morto.
Envia, pois, Febo, lá baixo ao plaino
com ordem de cuidar do seu cadáver.
O herói morto, com respeito e dor,
levanta Febo e para o rio o leva.
Lava-o da poeira, lava-o do sangue,
fecha as feridas espantosas, não deixando
visível traço algum e, derramando nele
perfumes de ambrosia, com resplandentes
olímpicas roupagens o amortalha.
Deixa-lhe branca a pele; e com um pente
de madrepérola penteia os seus negros cabelos.
Os seus belos membros compõe e pousa.
Parece agora um jovem rei auriga —
com seus vinte e cinco, vinte e seis anos —
repousando depois de ter logrado,
num carro de ouro e com velozes corcéis,
ganhar o prémio de glorioso certame.
Assim, quando cumpriu Febo
sua missão, chamou os dois irmãos,
Sono e Morte, ordenando-lhes
que levassem o corpo a Lícia, terra opulenta.
E para lá, Lícia, terra opulenta,
ambos os irmãos se puseram a caminho,
Sono e Morte, e, quando chegaram
à porta da mansão real,
o corpo entregaram coberto de glória
e regressaram logo a seus cuidados e trabalhos.
Quando na casa receberam o cadáver,
começaram
— com cortejos, honras e trenos,
libações profusas de sagradas crateras,
e todo o ritual — o triste enterro;
e, depois, experientes artesãos da cidade
e afamados talhadores de pedra
chegaram e erigiram o túmulo e a estela.