Três poemas

1.

A cidade desaparece dentro da cidade
como o mar naufraga em outro mar.
Mas e a alma – impura
porque lirismo – em que claridade
ela oscila e cai como um fruto
inventado, como um poema
apócrifo? Termina em mim
e eu termino como um pássaro
aprisionado em seu vôo?

2.

Não existe mais o cinema
da Rua Etrusca – não existe
nem sequer a Rua Etrusca:
outro modo de inventar
um território poético,
outro modo de nomear
a Rua São Sebastião, onde
há um extinto cinema (Cine
Etrusco) e o cheiro que antes irradiava
- fina e clara poeira de mármore -
esvaiu-se em outro cheiro de ontem
e ambos sucumbiram, diáfanos
como uma música que apenas a memória
escuta – um resto
de dias embalsamados
que nunca pertenceram a ninguém
(fina, clara, fria, ardente poeira ebúrnea).

3.

A tarde de sol retorna
apenas para o nosso engano.
Haverá quem estremeça e diga
é Setembro reencontrado
enquanto outro afirma na verdade
é o pior dos meses
renascido. A tarde de sol
é lenta como não estar mais aqui
e parte dela fica retida
nas copas das árvores e outro
tanto nos homens que cheiram a terra
remexida durante exumações.