Michael Symmons Roberts, Pelame
/Tradução de Hugo Pinto Santos
Encontrei o pelame do mundo
pregado a uma galeria de imagens
no cubículo de um hotel reles.
É, então, por isso que os rios secam até à crosta,
por isso a erva chora a cada madrugada,
por isso o vento é cru,
a terra, uma ferida aberta,
e aqui se pendura a sua dor,
como um troféu, atrofiado para lá
de qualquer taxidermia, resumido a um tapete de lareira.
Quem o tosquiou?
Não há registo no livro de hóspedes.
Ninguém pagou, limitaram-se a embainhar a lâmina
e seguir, deixando atrás a cama
intocada, a televisão que se satisfazia a si mesma.
Talvez não houvesse faca nenhuma.
Talvez o mundo abandone a cada ano
um abrigo para que outro cresça no seu lugar.
A pele era espessa como a de uma rena,
e tão negra que emitia reflexos de azul.
Experimentei-a, é claro, mas não.
Michael Symmons Roberts, Corpus, Jonathan Cape, 2004
Pelt
I found the world’s pelt
nailed to the picture-rail
of a box-room in a cheap hotel.
So that’s why rivers dry to scabs,
that’s why the grass weeps every dawn,
that’s why the wind feels raw:
the earth’s an open wound,
and here, its skin hangs
like a trophy, atrophied beyond all
taxidermy, shrunk into a hearth rug.
Who fleeced it?
No record in the guest-book.
No-one paid, just pocketed the blade
and walked, leaving the bed
untouched, TV pleasing itself.
Maybe there was no knife.
Maybe the world shrugs off a hide
each year to grow a fresh one.
That pelt was thick as reindeer,
so black it flashed with blue.
I tried it on, of course, but no.