Áries ascende em Peixes; "Scarface; Um sotaque baiano resolveria quase tudo

Áries ascende em Peixes

Uma delicadeza de repente nasce
vestida pelo suspense de uma guerra,
colhida pela primavera secreta
que só as corujas conhecem. 

É flor, mas pode ser miragem. 
se chover, abriga a humanidade
enquanto desconfia do calendário,
das promessas e do impossível. 

Quer quase tudo, vagueia às vezes
e volta lúcida, tão sabedora de si
que nem parece que dorme. 

Tão brilhante a chama, não se vê
o que só o travesseiro sabe:
se Mulan tiver que se entregar
que seja a um guerreiro. 


“Scarface”


I
Teus olhos precisam de deserto

Tu preferirias tirá-los e finalmente
separar um do outro, deixando o direito
mais confortável pra ensiná-los a justiça ou
deixar o gauche queimar como bruxa ou

Sentindo prazer em enterrá-los vivos
enquanto o resto do corpo cega

Adivinhar que se debatem nos grãos
que arranham sem dó como gatos

mas não 

II
Repousas os olhos na mancha
que me corta o umbigo, sente
que se debatem – pombos
esfomeados – tremelicam de leve e tu ficas
feio, não sou alquimista, tu saltas
no meu corpo e me preenche
de cobertas até que começo
a te ensinar o fogo

Só então tu olhas o Sol
recusas mais uma manhã

Meu corpo te mancha de terra.

III
Teus olhos precisam de um
deserto como a mancha
do meu umbigo precisa
dos teus olhos me molhando

Teus olhos me comem e
me alimentam

Te enraízas cada vez mais

Te afundas

IV
Se eu te desse um deserto
talvez a tua torneira de açúcar
fosse a cereja do bolo 

Não a loucura que respinga
Não a loucura que incomoda

Tu enfim me desertarias

mas não

V
O amor ignora o coração
porque fica preso nos olhos

VI
Manchaste-me.


Um sotaque baiano resolveria quase tudo

O calendário fantasia os inícios
colocando açúcar

são tão estúpidos os feriados:
começam limpos e acabam
com copo de cerveja
na roupa nova

bebo ayuhasca e camomila
em feriados apaixonados
para despertar

ninguém para culpar pelas mãos
geladas ainda
transo com detalhes
sempre fria
 
tenho medo de vomitar o medo

se eu ganhasse o War
dançaria na linha dos trópicos:
ensaio o sotaque baiano

quando acabar o poema
escreverei calmamente:
ter útero dói

não fabrico amor.
como se vomita?

um útero é sempre
um escândalo:
A DANÇARINA DESMEDIDA
CANTA GIL NA LINHA
DO EQUADOR