Os Homens da Neve

I

Chega a idade do frio
Como um seio descoberto,

E um aguilhão destina
O norte acinzentado.

Canícula vergada, um
Homem lega o arado,

Mas também a neve,
Essa tarefa inteira

Como nenhuma era.

Entretanto, os dentes
Da urna crescem, e é

Esplêndido o seu tártaro.

 

II

Outro homem, moldado
Nos braços duros da mãe,

Arde rente à lareira
De cabelos sacudidos.

Vê a chuva na vidraça
Prenhe como cachos

Maduros, diluindo
Caminhos de melancolia,

Cujas pegadas, profundas
Como tiros, cicatrizaram.

Apenas homem, sonoro
Floco em queda das calhas

Do tejadilho, e morrendo,
Diria, como um segredo:

Mas ele é toda a neve que vês.

 

III

Carícias mansas de chuva
No granito prolongado:

A invernia absoluta
Não tem lugar em vida.

Ardem volutas de algodão
Nas ramadas encurvadas,

E, de quando em quando,
Um trovão descarrila

No céu por desmoronar-se:

Este homem crê que deus
Desliga interruptores,

Deixando o vento
Suspenso nos carrilhões

Da esperança.

 

IV

Tudo pode ser ideia:

O homem parte
Da frágua contida,

E já os cavalos negros,
Sem freio pela geada,

Antecipam as pilastras
Dos templos cantantes.

E diz sobre a alta
Neve, dando pelo sol,

Ser a pomba de Ovídio,

A bela transfiguração
Dos anjos indiscretos

De antigamente.

Este homem cria, e,
Por instantes, engana

O nada.

 

 

V

De madrugada,
Sinos toaram:

Eram os homens
Da neve, mordidos

De branco, inflamando
A hulha nos pulmões,

Preparando a travessia
Dos espelhos de Inverno:

E, frondosas frentes,
Entalham os pórticos

De mármore molhado
E distam as paredes,

Inventando novos
Recifes no azul.

Jamais os encontraremos:
Eles são a púrpura da ausência.