HABITAR NA PARTITURA
/[Einziger, ewiger, allgegenwärtiger,
unsichtbarer und unvorstellbarer Gott]
“sobre a pele o tropel”
Luiza Neto Jorge
Poesenho para um filho de
Calíope: Pedro Braga Falcão
A
Entre ilhas há o som de pequenos e amoráveis
pássaros. Não falo de Messiaen!
Seres num ninho oceânico, o ovo primitivo
do dó e do ré, algures entre vagas. Não falo de Debussy!
No imenso da divisão, diferença, há aquilo
que não se pode registar.
E se for registado, não será lido.
Na linha clara do dia veremos
o ponto B e o ponto A na linha constantemente
inter
rompida. Não
falo de Schoenberg!
Dita a leitura indecifrável da partitura,
a dissolução da sint
axe,
da palavra, para que
o som escrito
seja redito noutra forma
ainda por ouvir.
A página (de palavras, pontos, pequenas vírgulas,
areias, flechas e setas, chuva e poças de
lama infinita)
é
todo um universo a que este pequeno
poema [não] pode aspirar. Fragmento inflexível de
chumbo.
Partida a batuta, esmagada pelo peso do martelo,
entre palavras antipoéticas,
eu faço,
eu digo:
no espaço em mim há essas folhas
onde o tempo não tem
nem começo nem fim. Cobracisne.
Que sejam os olhos a habitar a
indecifrável partitura
escrita inteiramente
por este coração impuro.
B
Vítor Teves - folha 4, de 6, de “Das Goldne Kalb”, lado B do Poesenho “Habitar na Partitura” (Agosto-Novembro, 2018).