A filosofia deve explicar a totalidade
/Jürgen Habermas deu uma entrevista ao El Pais, disponível aqui. Falou da sua linhagem marxista (apesar de agora se inspirar em Emmanuel Macron), ele que é o último sobrevivente da Escola de Frankfurt, das rápidas mudanças provocadas pelos novos meios de comunicação de massa, da atomização da opinião pública, com as múltiplas parcelas que a constituem a lerem e verem apenas o que encaixa na sua visão do mundo, anulando-se a velha figura do intelectual público, capaz de formar opiniões através do esclarecimento (ainda há intelectuais, diz, mas já não existem leitores para eles), referiu-se também às migrações massivas, consequência do colonialismo e do capitalismo, e até se mostrou favorável a um patriotismo constitucional, na medida em que uma Constituição é lavrada pela história de um país. É neste sentido que se vê como um patriota alemão.
Por tudo isto, a entrevista tem o maior interesse para esses leitores que ainda mantêm viva a necessidade de apanhar ideias diferentes das suas, vindas de alguém que aponta cuidadosamente antes de disparar (a metáfora é dele). Mas o que me motiva mais a escrever esta nota é o que diz acerca da filosofia. Como sabemos (força de expressão), a filosofia está em declínio, à força de querer ser mais uma ciência, com protocolos de rigor que decidam da validade ou invalidade do que se diz, deixou de pensar nos problemas tradicionais que durante séculos fizeram dela o espaço privilegiado do pensamento crítico. E para Habermas eles são aqueles que Immanuel Kant formulou no final da Crítica da Razão Pura: o que posso saber? o que posso fazer? o que me é dado esperar? o que é o ser humano? Ora, estes problemas são globais, não é possível responder-lhes com uma filosofia redutoramente especializada em encontrar, através de uma lógica modal, na melhor das hipóteses, o que torna um discurso válido, logicamente válido (mimetiza-se Ludwig Wittgenstein sem o aparato complexo da sua genialidade). Para Habermas, a filosofia “devia tratar de explicar a totalidade, contribuir para a explicação racional da nossa maneira de nos entendermos a nós mesmos e ao mundo.”