Eis mousikên (para voz própria)
/(Pedes-me que te resguarde da escuridão
mas entras-me nas veias e paras
onde te ilumina o silêncio
e dizes suplicas toda a poesia morre
e enquanto me bate o coração escureces
e fazes três sombras quando era jovem.
Disseste arrepiei-me e guardaste-me
porque lá havia sempre uma janela
por onde sempre deixaste entrar o sol
e um gato sempre houve um gato
no resguardo da escuridão e dizias
ainda hoje te peço um resguardo da escuridão
mesmo quando estamos sós ou lentos
e tropeças no meu sorriso forçado
porque tenho os lábios cansados de fingir
que te conheço que te sei que te meço
quando sempre me deixaste em contraponto
com um resto de floresta de um pinheiro
que se desfez em caruncho e se enterrou
onde nunca nada cresceu e resguardo-me
resguarda-me peço-te desta morte mórbida
que em nada morre não porque não veja
não porque não tenha fé mas porque sabes
que qualquer palavra é um gesto possível
que nunca alcança o deus que te repousa
e te reúne por mim por isso me dizes
protege-me desta noite protege-me desta noite
e tu bem sabes tu bem sabes
andamos assim há já algum tempo
sem contraponto sem forma sem pulso
ao menos disso tivemos coragem
até aquele quintal em que refizeste
o meu passado o meu passado ouviste
e deixaste-me lá parado procurando abrigo
e agora agora meu amor pedes-me
que te resguarde da escuridão agora
agora mesmo que todo o tempo
me rouba as entranhas me entra no quarto
onde sempre há um gato um simples gato
que rouba as entranhas de quase todo
de quase todo o tempo e ainda te suplico
salva-me resguarda-me da escuridão
mas tu murchas como sempre murcha
a semente a caminho da brusquidão
do impossível do inconcebível e gritas
como gritas comigo como se eu soubesse
menos de escuridão do que tu como se
como se eu não te chegasse como se nunca
como se nunca te tivesse dito carrega-me
resguarda-me desta solidão atira-me
atira-me tão longe quanto possam meus braços
e que caibam neles a tempestade.)