A Crise
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demais
muito pouco
insuficiente
gordo demais
magro demais
ou ninguém
riso ou
lágrimas
ou imaculada
negligência.
os que odeiam
os que amam
exércitos correndo pelas ruas de sangue
empunhando garrafas de vinho
esfaqueando e fodendo virgens
ou um velho num quarto barato
com uma fotografia da Marilyn Monroe
muitos velhos em quartos baratos sem
qualquer fotografia
várias velhas esfregando rosários
quando preferiam estar a esfregar caralhos
há uma solidão neste mundo tão grande
que a podes ver nos movimentos lentos do
ponteiro do relógio
há uma solidão neste mundo tão grande
que a podes ver piscar nos sinais néon
em Vegas, em Baltimore, em Munique
há pessoas tão cansadas
tão esmagadas
tão mutiladas pelo amor ou falta
dele
que comprar uma lata de atum em promoção
num supermercado
é o seu momento mais sublime
a sua maior victória
não precisamos de novos governos
novas revoluções
não precisamos de novos homens
novas mulheres
não precisamos de novas formas
troca de esposas
camas de água
cocaína
colombiana de qualidade
canalizações
vibradores
preservativos estriados
relógios com data
as pessoas não são boas umas para as outras
directamente.
raios para o Marx
o pecado não é a totalidade de certos sistemas.
raios para a cristandade
o pecado não é o assassínio de um Deus.
simplesmente as pessoas não são boas umas para as outras.
temos medo
achamos que o ódio é força
achamos que Nova Iorque é a maior cidade
da América.
o que precisamos é de menos brilho
o que precisamos é de menos instrução
o que precisamos é de menos poetas
o que precisamos é de menos Bukowskies
o que precisamos é de menos Billy Grahams
o que precisamos é de mais
cerveja
datilógrafos
mais tentilhões
mais putas de olhos verdes que não te quebrem o coração
como uma vitamina
não pensamos no terror de uma pessoa
sofrendo num lugar
sozinhos
intocados
ignorados
regando uma planta
sem um telefone que jamais
tocará
porque não existe.
mais os que odeiam que os que amam.
fatias de desgraça como tafetá
as pessoas não são boas umas para as outras
as pessoas não são boas umas para as outras
as pessoas não são boas umas para as outras
e as contas balançam e as nuvens ocultam
e os cães mijam sobre as rosas
e os assassinos decapitam as crianças como quem dá uma dentada
num cone de gelado
e o oceano vai e vem
vai e vem
sob a direção de uma lua insensível
e as pessoas não são boas umas para as outras.
Charles Bukowski, Second Coming. Vol. 5 No. 1 - 1977
Tradução: João Bosco da Silva