Bagos de Bastardo
/Nas folhas da videira
o reflexo da canícula –
silêncio no poço.
Com esta mão partida
ao que soarão os grilos
dos meus versos?
À volta da ermida
os toalhetes
dos encontros furtivos.
Quase impercetivelmente
a leve brisa e o tempo
arredondam as fragas de granito.
Arredondadas pelo tempo
e a leve brisa
as fragas de granito.
Há mais vento
quando passo
por choupos.
Quando passo
por choupos
há mais vento.
Gosto de me sentar
no silêncio do granito
ao vento.
Ah o som do vento
no granito
esculpido por milénios.
Como um beijo
de despedida
último sol de Agosto.
Nas silvas
do dólmen
a pena dum corvo.
Que rápido secaram
as amoras
dos caminhos.
Em cima da fraga
espero a tempestade –
vento de Setembro.
Chegará a tempestade
que o vento de Setembro
anuncia?
Semeadas de vazio
as casas onde
a ruína cresce.
Na muda presença
é onde habita
o maior silêncio.
Branco ainda
este sol
de Setembro.
Nas folhas da couve
brilham
refrescantes pérolas.
Bastou uma noite
para terminar o desassossego –
palha molhada.
Um banquete para pegas
e javalis
a vinha do meu avô.
Setembro –
do mosto
apenas uma memória.
Logo abraçam
as silvas
a fertilidade abandonada.
Onde crescem agora silvas
batiam-se
por um marco tombado.
Vinhas perdidas
lapides tombadas
eis o legado.
No meio do caminho
para a vinha perdida
cresce a videira brava.
Uvas da vinha velha
amoras dos caminhos
pequeno-almoço do poeta.
Na sua breve vida
o que teme
a borboleta?
À beira do rio
sentado
só eu passo.
Pequenas bolhas
o rasto do caminho
da lontra.
Açafrão do prado
no caminho –
aproxima-se chuva.
Nos bagos do bastardo
a doçura
das tuas mamas.
Setembro
regressam as moscas
do inferno.
Tarde de Setembro –
do que se despedem
os ramos da oliveira?
Agosto-Setembro 2022
Torre de Dona Chama-Cidões-Sabrosa