Alienação
/Procuramos casa
da mesma maneira que as sementes
procuram onde repousar
no deserto
somos o púlsar das aves/ a rocha linguística/
toda potencia calquera virtualidade/ unha exposición infinita/
un infinito de dor// non cruzamos correspondencias
Chus Pato, Sonora
Procuramos casa
da mesma maneira que as sementes
procuram onde repousar
no deserto
tradução de Tatiana Faia
Na sala das naturezas mortas lembrei-me;
quando cortas o cacho da vinha
a morte chega à uva
natureza morta e silenciosa
de frutos colhidos de flores desenraízadas
em vasos de cristal
escamas de peixes que perderam o brilho
No Outono as páginas
do calendário caem
uma romã rasga a tela
abre-se em fenda - os arilos inundam o chão
o vermelho é varrido pelos sapatos
dos visitantes
Esquecemo-nos de que as manchas de romã
não desaparecem
como beterrabas e outras coisas indeléveis
das naturezas mortas
Versões grega e inglesa:
Νεκρές φύσεις
Στην αίθουσα με τις νεκρές φύσεις θυμήθηκα
όταν κόβεις από το αμπέλι το τσαμπί
έρχεται ο θάνατος του σταφυλιού
Ζωή ασάλευτη και σιωπηρή
Κομμένων καρπών ξεριζωμένων ανθέων
σε κρυστάλλινα δοχεία
Λέπια ψαριών που έχασαν τη γυαλάδα τους
Το φθινόπωρο κάνει τα φύλλα
του ημερολογίου και πέφτουν
Ένα ρόδι ξεκολλά από τον καμβά
Σπάζει σπυριά ξεχειλίζουν
στο πάτωμα το κόκκινο παρασύρεται
από τα παπούτσια των επισκεπτών
Ξεχάσαμε πως το ρόδι άμα βάψει
δεν ξεβάφει
όπως τα παντζάρια και άλλα
ανεξίτηλα των νεκρών φύσεων
Still lives
In the room of still lifes I remembered;
when you cut the cluster from the vineyard
the death of the grape comes
still life and silent
of cut fruits of flowers uprooted
in crystal vases
fish scales that lost their sheen
In autumn the pages of
the calendar fall down
A pomegranate tears off the canvas
It cracks open- its arils overflow
the floor the red is swept along
by the shoes of visitors
We forgot that the pomegranate
stains do not fade
like beetroots and other
indelibles of still lifes
ANDRÓMEDA
Ajude-nos a salvar
Melania Trump!
Cosido o seu braço
em arame branco
à pele rugosa do Kraken
pouco pode dizer.
O seu sonho é a liberdade.
Assine o abaixo-assinado
e salvemos juntos
Melania Trump.
Enquanto isto Perseu ranhoso
uma espécie de Clooney num
filme dos Coen discute com Ares
a importância dos guarda-sóis
deitado numa espreguiçadeira
“São a indiferença dos homens”.
Para Ares Alexandrino tanto se
lhe dá haver guarda-sol ou não.
Uma vez em Myconos tudo o que
quer são umas grossas mãos
umas que saibam esfregar o
protetor solar nas costas.
Por favor assinem o abaixo-
-assinado aqui em baixo
____________________________
Para que tudo fique na mesma.
Enquanto o Kraken não estiver à
nossa porta o Mal não existe.
ESPARGUETE
“and Nat “King” Cole is telling me I’m unforgettable,
Which i aprecciate, although i know full well that
I will be forgotten”
- Ron Padgett
Levantou-se da cadeira e escrevendo
no quadro o trabalho de casa
“da página 10 até à página 1943”
disse muito suavemente
no seu tom de sempre
de morto-vivo
“Porque é que há palavras que
aparecem assim do nada?
Ao mesmo tempo o colega do lado
franzindo a sobrancelha perguntava-me
“é 1943 ou 1948?”
Entre as duas perguntas
imaginava-me a descalçar as minhas
novas All Star no tampo superior da
Ponte D. Luís e inevitavelmente a saltar!
Esparguete, sim! Se lá existe é porque
é um dos alicerces de toda a Ponte.
Já viram que coisa feia plantaram agora na
nossa nobre cidade? Dois pisos para quê?
ÁGOAS ETERNAS
a Fernando Pessoa
agora a
ágoa reporta-se à
doçura de outrora a
ágoa da ternura que
levou na hora certa toda
a amargura.
lavada mágoa a mágoa
a fria agrura
regressou
uma e outra vez
sem que se fechasse a porta.
agora
regresso à ágoa
da ágora para lavar-me
a memória
e o corpo futuro que
me agoira.
lava-me ágoa de
agora!
leva-me a dor de
outrora e com ela
a fiança do meu fim.
*ágoa - grafia de Pessoa
Tamara De Lempicka - “Andrómeda”, 1927/28. (Pormenor)
A esta hora os dedos cheiram a alho, os bifes estão a marinar,
Enquanto isso pego em mais um conto de Bukowski, porque é Novembro,
O segundo amor tinha-o deixado e passa um fim de tarde com
A sua amiga Vicki, vão até ao The Hollywood Cemetery
E às tantas ela diz “we should fuck back here”, estranhamente ele recusa,
Contudo beija-a longamente entre o silêncio dos mortos,
Também eu tinha deixado um dos meus amores longe naquele
Início de primavera, quando te beijei no cemitério da terra,
E entrei pela primeira vez no teu corpo violento,
Havia poucos dias tinhas fodido um amigo meu no seu carro,
Depois de regressarmos os três de uma noite nos copos
E me teres dito numa mensagem que me querias a mim,
Ele disse-me que gostavas de levar no cu, eu gostava de calças brancas,
E lembro-me de te ver pela primeira vez através das janelas partidas
Da minha casa de infância, com a tua prima, sempre tiveste uma beleza silenciosa,
Não demoro em amanhar os bifes, acabo o conto, acabo o poema,
E é por isto que gosto de Bukowski, não deixa de com a sua perdição
Me trazer o doce gosto derrotado do que estas mãos com cheiro a alho
Uma vez tocaram, para nunca mais.
Turku
26.10.2019
tradução de Tatiana Faia
Mar de Arava e Ló
Nas tuas margens ela transformou-se em pedra
Aquela que diz adeus às cidades
Em chamas
Aqui procuro a mulher de halite
Que traz flores brancas e púrpura
Procuro a beleza selvagem da rocha
Sem nome
Versões grega e inglesa
Νεκρά θάλασσα
Θάλασσα του Άραβα και του Λωτ
Στις όχθες σου γίνεται πέτρα
εκείνη που αποχαιρετά φλεγόμενες
πόλεις.
Εδώ γυρεύω τη γυναίκα από αλίτη
Λευκά λουλούδια φέρνοντας και μωβ
Γυρεύω την άγρια ομορφιά του βράχου
χωρίς όνομα.
Dead sea
Sea of Arabah and Lot
In your banks she turns to stone
The one who bids farewell to flaming
Cities
Here I seek the woman from halite
Bringing white flowers and purple
I seek the wild beauty of the rock
Without a name
Livros, filmes, ideias.