Jo Shapcott, Da Mutabilidade
/Tradução de Hugo Pinto Santos
Demasiadas das melhores células do meu corpo
estão irritadas, encrespadas, sensíveis
a este frio de Primavera. Estamos em dois mil e quatro,
e eu não conheço uma única pessoa que não se sinta pequena
por entre os números. Devastadoramente pequena.
Olha para baixo destes dias e vê
que os teus pés desconfiam do passeio e as tuas análises ao sangue
põem uma expressão carregada no rosto do médico.
Olha para cima e, pelo canto do olho,
encontras eclipses, folhas de ouro, cometas, anjos, candelabros,
junta-te a eles, se quiseres, aprende astrofísica, ou
música folk, sacrifícios humanos, a mortalidade,
aprende a voar, a pescar, o sexo com pouquíssimo contacto.
Só não te dês ao trabalho de procurar um destino que não seja o céu.
Jo Shapcott, Of Mutability, Faber and Faber, 2010
Of Mutability
Too many of the best cells in my body
are itching, feeling jagged, turning raw
in this spring chill. It’s two thousand and four
and I don’t know a soul who doesn’t feel small
among the numbers. Razor small.
Look down these days to see your feet
mistrust the pavement and your blood tests
turn the doctor’s expression grave.
Look up to catch eclipses, gold leaf, comets,
angels, chandeliers, out of the corner of your eye,
join them if you like, learn astrophysics, or
learn folksong, human sacrifice, mortality,
flying, fishing, sex without touching much.
Don’t trouble, though, to head anywhere but the sky.