Guillaume de Machaut, Julgamento do Rei de Navarra
/[Tradução de João Moita]
[...]
Posto o que, veio uma escumalha
Falsa, traidora e infame:
A Judiaria maldita,
A perversa, a desleal,
Que muito odeia e que ama o mal,
Que tanta prata e ouro deu
E promessas fez aos cristãos,
Para depois rios e fontes
Que límpidos corriam e sãos
Em vários lugares envenenarem,
Para muitos suas vidas perderem;
Que logo que alguém os buscava
Logo a morte súbito os tomava.
Pois que dez vezes cem mil vidas
Neles pereceram, no campo e na vila.
E assim foi sofrido
Este funesto infortúnio.
Mas o de alto assento e larga vista,
Que tudo governa e a tudo providencia,
A essa traição ocultar mais
Não quer, pois a fez revelar
E tão comummente saber
Que eles perderam corpo e fortuna.
Pois todo o Judeu foi destruído,
Enforcados uns, queimados outros,
A este afogaram, àquele deceparam
A cabeça com o machado ou com a espada.
E desta forma morreram também
Muitos cristãos dignos de desdém.
Guillaume de Machaut, Jugement du Roy de Navarre, 1349.
[...]
Après ce, vint une merdaille
Fausse, traïtre et renoïe:
Ce fu Judée la honnie,
La mauvaise, la desloyal,
Qui bien het et aimme tout mal.
Qui tant donna d’or et d’argent
Et promist a crestienne gent,
Que puis, rivieres et fonteinnes
Qui estoient cleres et seinnes
En pluseurs lieus empoisonnerent,
Dont pluseurs leurs vies finerent;
Car trestuit cil qui en usoient
Assez soudeinnement moroient.
Dont, certes, par dis fois cent mille
En morurent, qu’a champ, qu’a ville,
Einsois que fust aperceüe
Ceste mortel descouvenue.
Mais cils qui haut siet et loing voit,
Qui tout gouverne et tout pourvoit,
Ceste traïson plus celer
Ne volt, eins la fist reveler
Et si generaument savoir
Qu’il perdirent corps et avoir.
Car tuit Juïf furent destruit,
Li uns pendus, li autres cuit,
L’autre noié, l’autre ot copée
La teste de hache ou d’espée.
Et meint crestien ensement
En morurent honteusement.