Pastoral da Ribeira
/uma casinha incendiada surge no prédio ao lado
o rio cobre as vigas e pedras e cimento e pó
sob o rio se eriçam casas-lama os homens prontos e um emprego
trilhos e pregos e gente balouçam na casinha incendiada ao lado
afunda os pés de brincar co’ ua nanã que ri o ferro que afunda largo
um afogamento pronto pra uma cidade que nasce com seus homens fortes
na peneira a colher demora a massa e mofa e demora a massa
o fogão de barro submerso no lugar que nasce
acena um oi para a gente que vem incendiada
arde o fogo e a água a pedra e ferro da gente que vem
olha pra a direita mais adiante
folhas de palmeira pra palhoça um pouquinho de amianto
entulho e câncer e as cabritinhas tão bonitinhas ó as galinhas
cisca cisca cisca
ôôôôôôôôôôô
camisas numeradas regatas largas e de manguinhas
uma cidade emerge submersa
uma ponte metálica de madeira uma ponte
escaiada caiada com luzinhas pra piscar e muda muda
olha a novacor de dez em dez segundos
um conjunto habitacional popular há quase cem quilômetros
da gente que levanta e nasce uma cidade submersa
sete prediozinhos de três andares pra amontoar a gente
saída de uma favela onde se gritar um estádio de futebol
ôôôôôôôôôôô
uma cidade surge submersa no prédio ao lado
é tanta gente é tanta gente e tudo que sente e faz a gente
incendeia, amor
incendeia