Adam Zagajewski, "Vocês são os meus irmãos mudos"
/Tradução de João Ferrão e Anna Kuśmierczyk
Vocês são os meus irmãos mudos,
os mortos.
Jamais vos esquecerei.
Em velhas cartas encontro traços da vossa escrita,
que trepam até ao topo da página
como um caracol a subir o muro de um hospital psiquiátrico.
Os vossos telefones e moradas acampam continuamente
nos meus cadernos, esperam, dormitam.
Ontem estive em Paris, vi centenas de turistas
cansados e gelados. Pensei, são como
vocês, não podem encontrar um lugar, circulam inquietos.
E todavia, pareceria que isto é tão fácil, viver.
Basta um punhado de terra, um navio, um ninho, uma prisão,
um pequeno fôlego, algumas gotas de sangue e saudade.
Vocês são os meus mestres,
os mortos.
Não se esqueçam de mim.