ChinELAS Cruzadas e outros poemas
/ChinELAS Cruzadas
Outrora éramos bruxas
se sentadas como hoje estivéssemos.
Cruzemos as mãos
para afastarmos os barulhos mais
recônditos da noite ou talvez
para chamarmos as vozes das
perdidas loucas.
Cruzemos as mãos
e partilhemos entre os presentes as
nozes e o dom das histórias.
Que as sombras das labaredas
intermitentes naquela parede ali ao fundo
nos possam ajudar a fazer destes
homens melhores crianças
mais tementes a Deus
sobretudo ao Diabo.
“Um pai percorria a estrada
noturna e o barulho das correntes
era tão profundo
um som vindo de um búzio
a voz do diabo a chamá-lo
pela goela da morte.”
Enfiados nas t-shirts que diziam
CANADA
largas para poder conter toda a
saudade futura
escondiam a cabeça
na concentração do medo.
Hoje já não somos bruxas
apenas meras mulheres contando histórias.
Cruzemos as chinelas
para que as bruxas do além
queimadas em ignorância
nos possam auxiliar no encanto
sem que o Diabo apareça.
Eu sentada no sofá
cansada de tanta beleza da tarde
comia pipocas doces
enquanto fixava calada os cascos do Diabo
que davam colo à voz que
cantava.
10.07.19
SEM EDUCAÇÃO
“Não há ninguém, aqui, para me atender?!!!
Queria um Happy Meal e um Mc Flurry! Não me diga que não tem!
Já está? Que lenta! Vá despache-se!! Tenho pressa!”
E olhando para o moço do lado: “Que imbecil! E olha que Gorda!”
Lambido o Mc Flurry era a
altura de passear o Bolinha.
“Não percebo essa gente, não são como eu, que recolho a quente
o cocó do meu Chihuahua.
Essa gente não tem educação!”
A MENINA JÁ NÃO CHORA*
“Os meninos mijam de pé, enquanto
os cisnes dançam no lago.”
- Barbara Stronger
a Francisca Camelo
Não há outra mulher
de limada unha
cerrado punho
fina força que no
seu arrepio de
língua faça
frente à besta.
É na onda da língua
adocicada de sereia que tanto
enamora quem a respeita
como des_ventra quem
a pisa.
*Natália Correia
CLEOPATRA E MATA HARI
“sólidos quando perdidos se viram”
- Luiza Neto Jorge
Nunca houve solidez em vida. Nem
no tempo da pedra dos faraós nem
agora. A juventude está perdida
pelo menos desde a Idade da Pedra.
Tudo é paradoxo e quem não sabe
isso não conhece nada da vida. Um
cavalo é feliz de palas assim é aquele
que se fecha numa bolha ou se fecha
em altos muros e castelos de cartas.
De manhã sou cobra de tarde Ave e
à noite mera Mulher. Quem de vós é
estável como um charco sem chuva?
O CONCURSO DE APOIO ÀS ARTES
Abriu ontem o concurso para bolsas de Apoio
às Artes. Uma excelente notícia para todos
os artistas. Siga por favor os seguintes passos
Preencher formulário de vinte e cinco páginas
Entregar portfólio alargado e curriculum vitae
Identificar sítio pessoal e artístico assim como
Facebook Instagram Twitter Tinder e Grindr
Apresentar dez textos com Deleuze lá no meio
e acrescentar carta de recomendação do crítico
da moda com respetivo número de broches.
No final depois de apresentar todo o material
em cinco minutos sorrir muito e limpar à mão
o pó do casaco e sapatos do soberbo avaliador.
Apresentada toda a papelada e decorrido todo
o processo de seleção a bolsa de apoio à artes
foi direitinha para o pintor impressionista de
figos e hortênsias – o primo direito do Senhor
Presidente da Câmara Municipal! Ide-vos foder!
FAKE NEW(S) 748.3
Neste recolher obrigatório todo o
mau poeta será amordaçado por
cada palavra repetida nos seus
poemas e terá de dar ao Ministro
do Interior e obras públicas o Cu!
Quer goste quer não goste!
Perdão! Queria dizer o Bom poeta.
Aquele que vende a preço de ouro
e duro osso a sólida eternidade.
Quer goste quer não goste
terá de dar o cu ao Ministro!
O mau poeta (dizem eles- o que não
pertence ao Estado) é livre de dar o cu
se quiser e quando quiser desde que
fale apenas do efémero e da verdade.
Goya - El aquelarre [Bruxas Sabá], 1798