"PLANETARIUM" (1968) DE ADRIENNE RICH
/Caroline Lucretia Herschel, astrónoma alemã e a quem Adrienne Rich dedica o poema, foi, com Mary Somerville, uma das duas primeiras mulheres a serem admitidas na Royal Astronomical Society (1835) e a receber um salário por trabalhar como cientista. O cometa 35P/Herschel–Rigollet (1788) foi um dos vários cometas que Herschel descobriu. Dizem que Caroline também gostava muito de cantar.
PLANETARIUM
A pensar em Carolina Herschel (1750—1848)
astrónoma, irmã de William; e outras. [1]
Uma mulher na forma de um monstro
um monstro na forma de uma mulher
os céus estão cheios delas
uma mulher na neve
no meio dos Relógios e instrumentos
ou medindo o solo com estacas
aos 98 anos para descobrir
8 cometas
ela a quem a lua governou
como a nós
levitando pela noite adentro
ao volante de umas lentes polidas
Galáxias de mulheres, ali
penando por impetuosas
as costelas geladas
nesses espaços da cabeça
Um olho,
“viril, preciso e absolutamente certeiro”
dos loucos enredos de Uraniborg
descobrindo a NOVA
da luz cada um dos estímulos explodindo
desde do centro
enquanto a vida sai para fora de nós
Tycho [2] sussurrando por fim
“Deixem-me não parecer ter vivido em vão”
O que vemos, vemos
e ver é mudar
a luz que resseca a montanha
e permite a um homem viver
O coração da estrela maciça [3]
a suar pelo meu corpo
As frequências do rádio
caindo do alto da constelação de Touro
Fui bombardeada mas estou aqui
Estive aqui toda a minha vida onde
os motores de todos os signos se encontram
a mais rigorosamente transmitida e menos
traduzível de todas as linguagens do universo
Sou uma nuvem galáctica tão profunda tão invo-
luta que uma onda de luz poderia levar 15
anos a atravessar-me O que de facto
aconteceu Sou um instrumento que se parece
com uma mulher tentando traduzir pulsações
em imagens até que o corpo respire
enfim até à reconstrução da cabeça.
Adrienne Rich, "Planetarium", Collected Poems: 1950-2012, W. W. Norton & Company. 2018.
[1] Rich publica “Planetarium” em 1968, exatamente 120 anos depois da morte de Herschel.
[2] Tycho Brahe. Astrónomo dinamarquês e fundador do observatório Uraniborg (1576-1580).
[3] No original, “pulsar”. Não é uma coincidência que Rich escolha falar dos pulsares, já que o primeiro pulsar, que alteraria para sempre o nosso modo de pensar o universo, foi descoberto em 1967 por Jocelyn Bell; um ano exatamente antes da publicação de “Planetarium”. “E outras”, em inglês “and others”, que fecha a dedicatória do poema, refere-se a mulheres como Bell que, à semelhança de Herschel, não foram nem são reconhecidas no campo de estudos da astronomia.