Verbo transitivo direto; XII; Terceiro dia de equinócio; Estação; Dos gatos

 

 

VERBO TRANSITIVO DIRETO

Como dançam os cavalos
estendo o corpo à direita feito colar rasgo o dia
reunindo trêmulos espaços

eu estendo em vertical o meu braço
o cotovelo,
o antebraço,
o pulso e os dedos no ar
como quem busca e atira uma flecha.

 

 

XII

Caminho pelas ruas pedindo licença por ser mulher
Caminho pela casa da mãe pedindo licença por ser triste
Caminho entre os amigos pedindo licença por ser criança
Caminho entre os amores pedindo desculpa por ser simples
E no arrebol, quando o coração em claroescuro desdobra e acelera em trottoir
Coloco meu casaco ocre, busco
na noite
pés pra caminhar.

 

 

TERCEIRO DIA DE EQUINÓCIO

A guerra dentro e fora, e ainda assim
é preciso
abrir o cabelo
vestir as mesas
encontrar os papéis, rasgar os papéis, escrever os papéis, e depois
(encontrar os papéis, rasgar os papéis, escrever os papéis, e depois)

tatear com
o cu
o espaço.
Sentar os olhos de Kenna sobre o umbigo insone,
acariciar os mapas geográficos e acordar a voz das rochas.
Dançar na saliva das plantas,
cavar os silêncios,
comer os encontros,
chorar como o mar abraça as conchas.
Farejar memória e caminhar esquecimento.
Um cavalo de fogo lambe os buracos no meu dorso. Nada espera.

 

 

ESTAÇÃO

Cuidado: veículos
Para a sua segurança este veículo possui dispositivo que só permite a sua movimentação de portas fechadas
Atenção: mudança de linha
Acesso não permitido
Mind the gap

(Não são as palavras se formando aqui e agora que constroem o espaço. Mesmo que os teus olhos, a tua boca, o teu nariz, os teus ouvidos, as tuas mãos sobre esse meu corpo, fossem meus olhos, minha boca, meu nariz, meus ouvidos, minhas mãos. É o espaço. Upu que mora entre o meu umbigo e o meu sexo, que forma as palavras - estado democrático de direito - passos em busca da Terra sem Mal.)

Deixe a esquerda livre
1 - Puxe a alavanca
2 - Empurre a janela

 

 

DOS GATOS

Teu nome
na minha boca
carrega a mesma dor
dos gatos que cruzam agora no telhado.