a William Zeytounlian
E veio a palavra do SENHOR a Jonas, filho de Amitai, dizendo: Levanta-te, vai à grande cidade de Nínive, e clama contra ela, porque a sua malícia subiu até à minha presença. Jonas foge. Quem era ele para ir a Nínive, pregar? Dele riem já em sua aldeia, e Nínive é tanto maior. Embarca para Társis, ou qualquer dos pontos mais próximos do abismo, onde acaba o mundo quadrado. Céu de bonança, os ventos enfunam as velas, logo Társis ou o fim do mundo, longe de Nínive e da voz de toró e trovejadas do Senhor. À noite, no barco que balouçava tranquilo sobre as águas, tem um pesadelo terrível, uma tormenta se abate sobre eles, ameaça estraçalhar barco e tripulação, os viajantes clamam cada qual a seu deus, promulga-se de Jonas a culpa, lançam-no barco afora, um grande peixe o engole, três dias e três noites de digestão, a sua. Acorda, encharcado de suor. Chegaram a Társis, sãos, salvos. Jonas ali se estabelece. O tempo passa. Chegam notícias de que um homem, um certo Jonas, recebera a palavra do Senhor, fora a Nínive, pregara, os habitantes o ouviram, vestiram-se de saco de estopa, lançaram cinzas sobre a cabeça, o Senhor deles se apiedou, arrependeu-se do mal que queria fazer sobrevir-lhes, perdoou-os. Jonas sente uma nostalgia inexplicável, sem nome, dedica-se à plantação de aboboreiras, os negócios progridem, exporta para os quatro cantos, inclusive para Nínive. Mas há o sonho recorrente, o mesmo, que deixa de ser pesadelo, sonho pelo qual anseia toda noite, Jonas de volta no barco, uma tormenta se abate sobre eles, ameaça estraçalhar tudo e todos, os viajantes clamam cada qual a seu deus, promulga-se de Jonas a culpa, lançam-no barco afora, um grande peixe o engole, três dias e três noites de digestão, a sua. Mas Jonas agora avança na narrativa do sonho, passa a cada ano um pouco mais do ponto em que despertara naquela primeira noite do pesadelo agora sonho, Jonas no grande peixe, três dias e três noites, clama, clama, clama, o Senhor o ouve, apieda-se, o grande peixe o vomita nas areias, Jonas vai a Nínive, prega, os habitantes o ouvem, vestem-se de saco de estopa, lançam cinzas sobre a cabeça, o Senhor deles se apieda, arrepende-se do mal que queria fazer sobrevir-lhes, perdoa-os, é ele o Jonas de que outro Jonas, em Társis, ouve falar. Mas é apenas um sonho. Ele está em Társis, tem o monopólio da plantação de aboboreiras, mas caminha como se algas rodeassem sua cabeça, Jonas é um grande peixe com um Jonas em suas entranhas. Quando morre, rodeado de seus filhos e netos, seu testamento consiste de uma única sentença: Enterrem-me em Nínive. Proibitivos os custos, questões de saúde pública, transportar cadáveres em longas viagens pelos mares, cheiro de decomposição enojando os passageiros no convés. Os filhos decidem cremá-lo. Suas cinzas, espargem no mar.