Mensagem de solstício de Inverno

Já quase todos repararam que o Natal é a forma cristã de celebrar o solstício de Inverno, recuperando ritos antigos de júbilo pelo início do contra-ataque ao domínio da Noite. A partir daqui, o Dia vai, lenta mas inelutavelmente, ganhar terreno à obscuridade, o Sol vencerá a Lua, a Luz as Trevas. Tudo retornará, é verdade, mas por enquanto estamos felizes pelos pequenos ganhos diários da claridade.

Este ciclo astronómico tem inúmeras similitudes, por exemplo na dicotomia Romantismo (noite) / Classicismo (dia), espaço rural (noite) / espaço urbano (dia), mentira (noite) / verdade (dia). Talvez grande parte das relações dialécticas encaixem nessa primeira evidência de contraste que os pais fundadores da humanidade, vivendo-a mais do que reflectindo sobre ela, tomaram como paradigma de uma vida que quis ser, na Terra, polifónica, alimentada por dissensos insolúveis.

 Nesta época, talvez reverberando o que acabo de expor, temos por hábito criar mais uma dialéctica: o que repetiremos no próximo ano civil / o que extinguiremos nesse mesmo período de tempo. Ficará o que julgamos iluminar-nos, desaparecerá o que julgamos obscurecer-nos. Claro que os enganos e os incumprimentos fazem legião. Mas fica a intenção, no limite o ser humano é um ser de intenções, derrotado como sempre será pela morte (noite).

Quero, contudo, deixar uma vontade de nova moralidade, que é como quem diz: destacar o que mais nos encanta. Faço-o citando o ateu evangélico (um dia explico esta quase-contradição) Friedrich Nietzsche:

 “buscamos aqueles cuja existência é para nós uma alegria e encorajamo-los, enquanto fugimos dos outros – eis a verdadeira moralidade![1]

Aproximação (dia) / afastamento (noite). Mas apenas à noite podem brilhar as estrelas, e, ainda com Nietzsche, a vida só vale a pena se houver a intenção de criar uma "estrela dançante".

 

[1] “wir suchen die aus, die uns Freude machen und fördern sie und fliehen vor den Anderen — das ist die rechte Moralität!” (FP 1880, 6[23])