Três Poemas de "Amanhã Alguém Morre no Samba"

outros experimentos falharam
chorar e seguir com a língua o caminho da lágrima
ralar o cotovelo e seguir com a língua o caminho da gota de sangue
ejacular e seguir com a língua
seguir o fio de sol
feito os trevos do antigamente no jardim
aqui
desde tanto
uma rua vazia e japonesa
minha cabeça é pior que o diabo
pior que o diabo que enfio entre as tábuas
as tábuas
desde que tanto cheguei aqui
é o diabo
melhor que seja
digo
a cor que isso vai tomando
sei que estou viva porque me vejo nos olhos do diabo
sei que respiro
porque o tenho tomando meu hálito
sei nada dos meus medos
porque sua cabeça linda, vermelha, tríplice
guarda noturno sonâmbulo diário crepuscular
ninguém meu amorninguém como nós conhece o sol*
meu diabo
às barbas do meu diabo
suas orelhas amplas
suas marcas nas minhas paredes
nasci para ser umidade cor de concupiscência
pensei
me visto de alçapão e choro
mas estou pelada

mas estou calva
estou feia e fútil
basta
basta quando que sou o alçapão
sou possuída e inquilina
céus
eu sou o alçapão
espia:
o diabo é minha carne pênsil.

* Sebastião Alba

*** 

significar o osso da coisa queridinha
os enfeites da casa gritam comigo
ombreiras esquadrias agulhas gatinhos da china
decoram as margens do meu amor
o osso
me afundo na tua reminiscência
o osso e as antenas
gritam
como se tudo fosse o grande do tempo
as esquadrias dos óculos gatinhos da china
omoplatas de prata queridinha
o bafo da trilha
a carne da coisa
tão necessária insignificante
na estrutura superfície da aberração amor

***

queria sondar o excêntrico intocável através do sangue da fulaninha
queria procriar e queria trucidar com a pressa do passo
lembra?
andávamos
sem a nós nos encontrar
ai meu amor que não chega
ai a melancolia no fundo do prato, anjo  

aquieta essa boca
amanhã alguém morre no samba


Amanhã Alguém Morre no Samba de Carla Diacov, editado pela Douda Correria, foi apresentado ontem e inclui os três poemas que aqui se reproduzem. Aqui fica a recomendação do livro. Pedidos por aqui