Charles Bukowski, "O triturar"
/tradução de João Coles
de mais
de menos
demasiado gordo
demasiado magro
ou ninguém.
riso ou
lágrimas
os que odeiam
os que amam
estranhos com rostos como
a superfície de
pioneses
exércitos que percorrem
estradas de sangue
brandindo garrafas de vinho
baionetando e fodendo
virgens.
um velhote num quarto reles
com uma fotografia da M. Monroe.
há uma tão grande solidão neste mundo
que a podemos vislumbrar no movimento lerdo
dos ponteiros de um relógio
pessoas cansadas
mutiladas
seja por amor ou por falta de amor.
as pessoas não conseguem ser boas umas com as outras
cara a cara.
os ricos não são bons com os ricos
os pobres não são bons com os pobres.
nós temos medo.
o nosso sistema educativo diz-nos
que todos podemos ser
manda-chuvas vencedores.
não nos falou
da miséria
nem dos suicídios.
nem do terror de uma pessoa
contorcendo-se num lugar
sozinha
sem que lhe toquem
sem que lhe falem
regando uma planta.
as pessoas não são boas umas com as outras
as pessoas não são boas umas com as outras
as pessoas não são boas umas com as outras
as pessoas não são boas umas com as outras
presumo que nunca serão,
não lhes peço que sejam,
mas por vezes penso sobre
isso.
os rosários vão balançar
as nuvens vão nebular
e o assassino degolará a criança
como se trincasse o cone de um gelado.
de mais
de menos
demasiado gordo
demasiado magro
ou ninguém
mais são os que odeiam do que aqueles que amam.
as pessoas não são boas umas com as outras.
se porventura fossem
as nossas mortes não seriam tão tristes.
entretanto olho para raparigas jovens
caules
flores de oportunidade.
tem de haver uma maneira.
haverá decerto uma maneira que ainda não
pensámos.
quem pôs este cérebro dentro de mim?
ele chora
ele exige
ele diz que há esperança.
não dirá
“não.”
in Love is a Dog From Hell - 1977
The Crunch
too much
too little
too fat
too thin
or nobody.
laughter or
tears
haters
lovers
strangers with faces like
the backs of
thumb tacks
armies running through
streets of blood
waving wine bottles
bayoneting and fucking
virgins.
an old guy in a cheap room
with a photograph of M. Monroe.
there is a loneliness in this world so great
that you can see it in the slow movement of
the hands of a clock
people so tired
mutilated
either by love or no love.
people just are not good to each other
one on one.
the rich are not good to the rich
the poor are not good to the poor.
we are afraid.
our educational system tells us
that we can all be
big-ass winners.
it hasn't told us
about the gutters
or the suicides.
or the terror of one person
aching in one place
alone
untouched
unspoken to
watering a plant.
people are not good to each other.
people are not good to each other.
people are not good to each other.
I suppose they never will be.
I don't ask them to be.
but sometimes I think about
it.
the beads will swing
the clouds will cloud
and the killer will behead the child
like taking a bite out of an ice cream cone.
too much
too little
too fat
too thin
or nobody
more haters than lovers.
people are not good to each other.
perhaps if they were
our deaths would not be so sad.
meanwhile I look at young girls
stems
flowers of chance.
there must be a way.
surely there must be a way that we have not yet
thought of.
who put this brain inside of me?
it cries
it demands
it says that there is a chance.
it will not say
"no."