Dois poemas de Dirceu Villa
/sr. barbáro
um poema fere o sr. barbáro na primavera,
no inverno, em qualquer estação; debaixo do
braço, na virilha, na garganta, todos fatais ao
mais rude bufão; que sabe ler, e não sabe ler.
o sr. barbáro pede ajuda de deus quando quer
matar, quando põe pedras na boca para falar,
quando cospe atacando cores e abre um ânus
dentro do crânio; o sr. barbáro caga na bolsa.
soldado, sonha-se o sr. barbáro, e bate muita
continência [o incontinente]; o sr. barbáro é são,
mas é demente. o sr. barbáro tem um esgoto sob
a língua, olhos de estuprador e impotente. não
separa ódio de comoção, ou virtude de covardia:
o sr. barbáro gritava à tv numa poltrona até o dia
em que lhe deram poder. o sr. barbáro parece ter
ratos no rosto. haver vida o fere, é um desgosto.
gentileschi
schloss weißenstein, suzana tem nojo e dor nos olhos, sua
nudez sentada se contorce diante de dois velhos cobiçosos
a despeito do nojo e da dor [ou por causa do nojo e da dor].
artemisia amarrota-lhe os olhos diante do esgar rosnado de
quem segreda o assalto de seu sexo; em quatro anos, suzana
se torna judite, ganha a ajuda de uma amiga, e os dois velhos
se fundem no grande holofernes: as mãos das mulheres forçam
o corpo contorcido do general, a espada trincha pele, músculos
nervos, ossos. a determinação nos olhos de judite e de sua ajuda
só se equipara ao desespero nos olhos da cabeça quase solta
do corpo que fora dois e jaz agora um: as mulheres se afastam
do combate [técnicas da vingança exata] no museo nazionale.