3 poemas de Eeva Kilpi

Pai, ontem choveu

e hoje choveu ainda há pouco.

Contudo está quente.

Deve vir um bom Outono de cogumelos.

 

Pai, em breve dão as notícias da noite

e a sauna está pronta.

 

Pai, regressa ao meu sonho.

Dar-te-ei pão, queijo

a bagas,

irei buscar água à nascente.

 

Pai, deixa-me practicar ainda.

É estranho estar assim insensível.

 

 

 

Bem se realmente

queres que me confesse

que assim seja:

eu tive

trinta e seis amantes.

Sim, tens razão,

é demasiado.

Trinta e cinco teriam chegado.

Mas amor, o trigésimo sexto

és tu.

   

 

Amantes oferecem um ao outro reinos,

novas pátrias, continentes e raras línguas.

Quando se separam, os presentes permanecem-lhe,

são irreversíveis

E o seu amor permanece neles

como literatura, habilidade na língua,

poemas e histórias

que eles juntos compuseram

na língua de cada um.

Assim o amor torna o mundo mais amplo,

assim, mesmo no seu desaparecimento

dá à luz paz e compreensão.

Novos corações se abrem,

há um pouco mais a partilhar

com os amantes seguintes.

 

Eeva Kilpi

4 poemas de Eeva Kilpi

*

Amor é a mais elástica dimensão humana.

É como a vagina.

Adapta-se ao grande e ao pequeno.

 

A natureza não decepciona.

 

 

*

Outono.

Agora lavo o esperma do verão passado.

Pouco mas mesmo assim.

É pena.

Não coube todo em mim.

E longo é o inverno.

 

 

*

É melhor que nos tenhamos conhecido só agora.

Se nos tivéssemos conhecido antes

Já estaríamos separados.

 

 

*

Diz-me já se te incomodo

disse ele enquanto entrava porta adentro,

que sairei de seguida.

 

Tu não só me incomodas,

respondi,

abalas toda a minha existência.

Bem-vindo.

 

Eeva Kilpi

4 poemas de Bo Carpelan

Círculo

 

Ali, ao lado da pálida árvore,

ele escutou os passos de minha mãe.

O mortal é o nosso amor e ternura,

o dia que passa miraculoso porque nunca regressa.

Eu que escuto os teus passos na erva

e tu que estás perto de mim,

talvez no crepúsculo cinzento

lembrar-se-ão eles quem agora sonha?

 

Entre os Versos

 

Entre os versos e a vida,

o dia abandonado e o papel abandonado,

dias em que vês que o amor não é apenas vento sobre erva:

este é o “dia da vida”

e talvez quebrado

e o dia vive e é parte do seu próprio lado negro

virado em direção a nada.

 

Sob as mesmas nuvens

 

Sombras misturam-se com sombras,

a erva com o seu cabelo,

morto jaz alguém, alguém que morreu

sob as mesmas nuvens.

 

Abre-se o dia

 

Abre-se o dia,

aves pairam sobre a água,

uma nuvem aproxima-se

e eu retomo o meu trabalho

de forma a que com duas palavras

ganhe uma de volta.

 

Bo Carpelan, The Cold Day (1961)

3 poemas de Pentti Saarikoski

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Cresci, que tristeza,

                não aprendi a patinar, tinha medo das raparigas, de manhã,

quando penso,

que tristeza, ter deixado tanto

para trás.

 

 

 

Fiz o meu trabalho, agora estou aqui, sentindo-me mal,

                               que tristeza,

                nos meus olhos a conversa fiada da gente.          

Tenho vivido, longamente, deste momento à morte

                a viagem não é longa, quando estico as minhas costas,

                                                                               dos meus ombros

                                                               caem, esvoaçantes

folhas inúteis.

 

 

 

Tenho muitas vezes chorado, tenho-me enfurecido, bati no fundo da noite,

                seguindo o meu caminho, conseguindo,

                               fracassando,

                                               gritei até ser ouvido e vim

                                                               e fui,

                               agora estou aqui.

 

Pentti Saarikoski, Ääneen (1966)

 

Traduzido do Finlandês por João Bosco da Silva